'Prioridade é me mudar antes que esse prédio desabe', diz moradora de um dos prédios com notificação de desabamento em Fortaleza
25/04/2025
(Foto: Reprodução) Cinco prédios de uma mesma construtora em Fortaleza tiveram notificações por risco de desabamento emitidos pela Defesa Civil entre 2019 e 2024. Moradores denunciam más condições estruturais em prédios de bairros nobres em Fortaleza
Mobilizações conjuntas e busca de auxílio jurídico fazem parte das reações de quem vive em algum dos cinco prédios que receberam notificações por risco de desabamento em Fortaleza. Entre os moradores, a tentativa é de se mudar após anos de reclamações por problemas estruturais em prédios mantidos pela Construtora e Imobiliária SAD.
“Centenas de famílias estão nessa situação de pânico e vulnerabilidade. Todos desesperados sentindo a urgência de se mudar e sendo pegos desprevenidos. [...] Meu cachorro precisaria fazer uma cirurgia agora que me custaria R$ 2 mil, mas vai ter que ser adiada porque a prioridade é me mudar antes que esse prédio desabe”, diz uma moradora.
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Ela e a companheira, que preferem não ser identificadas, moram no prédio Alda Cardoso Linhares, no bairro Aldeota, área nobre de Fortaleza. O edifício conta com 21 andares e teve notificação por risco de desabamento em 2024.
Em lista confirmada pela Defesa Civil de Fortaleza, cinco dos 13 prédios da construtora receberam notificações por risco de desabamento entre os anos de 2019 e 2024. Conforme o órgão, nenhum dos casos envolveu risco alto e necessidade de interdição.
Moradores têm urgência para sair
Moradores denunciam infiltrações, vazamentos e falhas na manutenção no edifício Alda Cardoso Linhares, na Aldeota
Arquivo Pessoal
Vivendo há quatro anos no prédio, a residente contratou um advogado para ter amparo legal ao romper o contrato de aluguel. Ela denuncia que a construtora responsável pela manutenção não seguiu melhorias apontadas em vistoria da Defesa Civil para diminuir os riscos identificados.
“Essa área externa, onde as crianças sempre brincam, a Defesa Civil mandou delimitar porque estão caindo os rebocos das fachadas do prédio. Não sei como nunca teve uma tragédia aqui”, alerta.
Segundo moradora, área onde crianças brincam no edifício Alda Cardoso Linhares deveria estar interditado
Arquivo Pessoal
Ela explica que outros inquilinos relatam a mesma urgência de se mudar, apesar dos gastos envolvidos na decisão. Os relatos compartilhados entre eles são de uma burocracia excessiva para entregar os apartamentos e encerrar os contratos de aluguel.
“Está sendo bem difícil providenciar tudo com tanta urgência, sem programação prévia. Vou ter custos com novo [valor de] caução, porque já entendi que perdi o anterior. Advogado, mudança, reparos nesse apartamento completamente deteriorado por eles mesmos... Vou gastar bem mais que 10 mil reais. Minha namorada vai me ajudar”, desabafa a moradora.
A companheira dela explica que prefere providenciar a saída e depois lidar com as consequências contando com um auxílio jurídico para responsabilizar a construtora. “Eu não entendo de engenharia, e ninguém diz nada sobre a situação atual do prédio. A gente não vai pagar para ver”, complementa.
Dentre as diversas irregularidades denunciadas pela locatária, ela aponta aumentos abusivos no preço do aluguel e valores de IPTU que foram pagos para a construtora, sem que a empresa tenha repassado para a Prefeitura.
Edifícios com notificações
Edifício Antônio Cardoso Linhares Neto é um dos cinco prédios com risco de desabamento notificado em Fortaleza
Thiago Gadelha/SVM
As vistorias realizadas pela Defesa Civil podem identificar riscos em diferentes níveis. Desta forma, o risco pode ser considerado leve, médio, alto e crítico.
Ao g1, o coordenador da Defesa Civil de Fortaleza, coronel Haroldo Gondim, afirmou que estas vistorias feitas nos edifícios não apontaram riscos em níveis críticos, que justificariam a interdição dos imóveis.
“Quando a gente fala que tem um risco de desabamento, isso não quer dizer que o imóvel vai colapsar. Isso não quer dizer também que seria todo o imóvel. Às vezes, a gente vai para uma análise estrutural, e é só uma parte de uma garagem, um afundamento em uma parte do térreo”, exemplifica o coordenador.
Os prédios com notificações foram:
Residencial Linhares: Avenida Humberto Monte, 1799 - Bela Vista. Registro de risco de desabamento em 2024.
Edifício Alda Cardoso Linhares: Avenida Rui Barbosa, 2055 - Aldeota. Registro de risco de desabamento em 2024.
Edifício Antônio Cardoso Linhares Neto: Rua Leonardo Mota, 2210 - Dionísio Torres. Registro de risco de desabamento em 2023.
Edifício Luis Linhares II: Rua Padre Valdevino, 1515 - Aldeota. Registro de risco de desabamento em 2023.
Edifício Luís Linhares: Rua Joaquim Alves, 261 - Meireles. Registro de risco de desabamento em 2019.
Prédios sob risco de desabamento em Fortaleza
Arte g1
Os relatos dos moradores dão conta de problemas graves nos cinco prédios e também em outros administrados pela mesma construtora na capital.
Situados em bairros nobres da capital, como Aldeota, Meireles, Dionísio Torres e Joaquim Távora, os edifícios continuam com unidades para alugar e contam com taxas condominiais custando, em média, R$ 500.
Dentre os problemas que causam temor pela segurança, estão: elevadores que quebram constantemente ou deixam pessoas presas, paredes com infiltrações, vazamentos de água e pedaços do revestimento externo caindo em áreas onde as pessoas circulam.
O que diz a construtora
Em nota aos moradores, a Construtora e Imobiliária SAD afirma que iniciou, nesta terça-feira (22), um processo de inspeção técnica em suas construções.
“Para isso, realizamos uma criteriosa seleção de engenheiros civis especializados em patologias construtivas, garantindo que as avaliações sejam conduzidas com o mais alto padrão técnico e ético”, diz o texto.
“Informamos que todos os edifícios com alegações de risco estrutural já foram vistoriados por essa equipe. Os relatórios preliminares indicam que não há evidências de risco à segurança estrutural das edificações inspecionadas. Ressaltamos que os laudos técnicos completos serão prontamente encaminhados à Defesa Civil, juntamente com os planos de ação para a correção de eventuais patologias identificadas”, complementa a nota assinada por Antônio Cardoso Linhares, proprietário da empresa.
Prédios fora da lista também geram preocupações
Problemas nos elevadores são reclamações constantes no Edifício Vera Cavalcante Linhares, em Fortaleza
Arquivo Pessoal
Falta de água, elevadores com falhas, buracos no teto e alagamentos em dias de chuva são problemas relatados no Edifício Vera Cavalcante Linhares, também administrado pela SAD.
Para o cabeleireiro Artur Felipe, de 32 anos, que vive de aluguel no prédio, a sensação é de também estar em risco. Isso porque os problemas se assemelham aos relatados por quem mora nos prédios que receberam notificações da Defesa Civil.
“A estrutura é decadente mesmo, e aí a gente tem medo. Porque a gente já mandou e-mail, a gente tira foto, a gente faz vídeo, já teve morador aqui que foi lá [na sede da imobiliária]... E a gente não vê nada acontecendo”, afirma.
O prédio fica na rua Gonçalves Ledo, quase em frente ao Mercado dos Pinhões. Imagens feitas por locatários mostram pedaços de forro caindo, elevadores com botão faltando, goteiras e vazamentos molhando os carros estacionados na garagem.
No local, uma ação dos moradores é alertar os clientes que chegam para visitar os apartamentos colocados para alugar.
Moradores registram rachaduras e buracos no forro do edifício Papaitio, no bairro Joaquim Távora
Arquivo Pessoal
Um inquilino do edifício Papaitio, no bairro Joaquim Távora, também afirma que a sensação de abandono é comum entre os moradores. Em imagens do prédio repassadas à reportagem, é possível ver paredes e tetos com infiltrações, grandes rachaduras e pedaços que já chegaram a desabar.
“Eu estou contando os dias para o meu contrato [de aluguel] terminar porque não é fácil. Aí quando a gente vai reclamar, eles simplesmente dizem: ‘Se mude se não tá gostando, vá para outro canto’.
Morando há três anos no edifício, ele comenta que nunca soube de uma inspeção predial realizada nos últimos anos.
Conforme o morador, outros locatários buscam se organizar para entrar com processos judiciais contra a empresa por conta das falhas na manutenção do prédio.
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